Some people think football is a matter of life and death. I assure you, it's much more serious than that.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

A evolução das defesas na NFL

Richard Dent faz uma ótima demonstração de 
como a defesa deve jogar sob as novas regras



Desculpem a inatividade recente, a ressaca pós-Super Bowl ainda não passou e o nosso Mailbag não está recebendo perguntas suficientes pra justificar um post até agora. Enquanto esperamos mais perguntas (Vamos, galera, não desanimem agora, mandem seus emails para tmwarning@hotmail.com!), vamos falar um pouco sobre a evolução das defesas na NFL.

Alguns aqui talvez se lembrem de um post que fizemos já faz algum tempo sobre a evolução do jogo aéreo na NFL. Nesse post, nós comentamos sobre como as regras que surgiram ao longo dos anos - em especial de 2004 pra frente - tiveram o efeito de facilitar em muito o jogo aéreo na NFL. Isso causou, é claro, um grande direcionamento do jogo na NFL para o ar, e os Quarterbacks e os ataques passaram a ter um peso muito maior do que tinham até então. Isso também fez com que os números dos Quarterbacks e Wide Receivers pós-2004 explodissem se comparado aos números anteriores, e em nossa mania de querer comparar tudo em números sem pensar no que está por trás deles, acabávamos olhando pra números extremamente inflados e exaltando as estatísticas dos jogadores de hoje como sendo superiores às dos jogadores de 20 anos atrás. As 5300 jardas do Drew Brees em 2011 foram incríveis, claro, mas nós olhamos pro número 5300 em absoluto, esquecendo que conseguir 5300 jardas hoje é muito mais fácil do que conseguir 5000 trinta anos atrás. O jogo muda, as regras mudam, e nós esquecemos disso, continuamos tratando os números como se significassem a mesma coisa em qualquer época.

Mas voltando ao tópico principal, as mudanças que o jogo aéreo sofreu ao longo dos anos, e em especial na década de 2000, determinaram como os ataques iam jogar, deram ênfase ao jogo aéreo, colocaram o jogo terrestre em segundo plano e tornaram a NFL numa Liga onde o jogo terrestre é o que da o tom do jogo, e onde eé cada vez mais difícil vencer sem um grande QB. Mas hoje, vamos olhar o lado contrário da questão, e analisar como as defesas na NFL ficaram com essas mudanças nas regras e no jogo, e qual o panorama pras defesas da NFL nos próximos anos.

Para quem não leu ou não lembra desse post e está com preguiça de clicar no link acima, um breve resumo. Ao longo dos anos - e em especial na década de 2000 - a NFL começou a mudar algumas regras e instituir algumas regras novas visando incentivar o jogo aéreo na NFL. Os principais motivos para essa mudança foi a mentalidade defensiva que dominou a NFL no começo da década e levava a muitos jogos lentos e de placares baixos, com defesas dominando os ataques. Isso se deu, em parte, por uma certa entresafra de grandes Quarterbacks na Liga. A geração anterior (Troy Aikman, Dan Marino, Joe Montana, Steve Young, John Elway, Jim Kelly, etc) estava saindo de cena e a nova geração (Tom Brady, Peyton Manning, Ben Roethlisberger, Drew Brees, etc) ainda não tinha aparecido o suficiente para dominar o cenário da NFL. Ainda que tivéssemos Brett Favre e Kurt Warner destruindo recordes diariamente, era muito pouco frente ao maior cenário da Liga. Tirando o extremamente ofensivo Rams (The Greatest Show on Turf), que foi campeão do Super Bowl em 1999, quem aparecia em peso eram as defesas. O Ravens de 2000 (Trent Dilfer de Quarterback), o Patriots de 2001 (Um Tom Brady burocrático e eficiente de QB, mas secundário a uma grande defesa), o Bucs de 2002 e até mesmo o Pats de 2003 eram todos times que tinham uma grande defesa e um ataque medíocre, em geral que contava com um forte jogo terrestre mas que tinha como grande âncora sua defesa. As defesas de Ravens e Bucs, em particular, estão entre as maiores de todos os tempos. Os jogos truncados, defensivos e de poucos pontos começaram a dominar o cenário da NFL, e a Liga decidiu mudar as regras pra aumentar o poder dos ataques.

Não é a toa que desde 2004 os campeões do Super Bowl tiveram como QBs titulares Brees, Brady (Em 2004 pela primeira vez assumindo uma posição central no time), Manning, Aaron Rodgers, Eli Manning e Big Ben, depois de ver um Brady pirralho e burocrático, Trent Dilfer e Brad Johnson ganhando Super Bowls no começo da década. As novas regras restringiram e muito o que a defesa podia fazer - não podiam mais acertar jogadores com o capacete, não podiam mais atingir jogadores na área da cabeça, não podiam mais encostar nos recebedores, não podiam derrubar QBs abaixo da cintura... Ou seja, na década de 80/90 a defesa tinha muito mais recursos tanto pra marcar os recebedores adversários como para atacar o QB como para dar tackles. Agora os defensores estão muito mais limitados, o jogo aéreo domina a NFL e estatísticas de passe e recepções são quebradas diariamente. A NFL pode justificar essas regras dizendo que estão protegendo a saúde dos jogadores, o que até é verdade em algum nível, mas o verdadeiro motivo era aumentar os placares, tornar os jogos mais abertos e, na avaliação deles, mais atraentes para o público.

Uma vez que o principal impacto dessas mudanças foi o incentivo ao jogo aéreo, era de se esperar que o caminho para o sucesso das defesas fosse fortalecer a defesa contra o passe. Formações Nickel (com um cornerback extra), melhores safetys e cornerbacks, estratégias de cobertura complexas... Esse parecia, no primeiro momento, ser o caminho de sucesso para defesas. Se você conseguisse montar uma grande secundária e limitar o jogo terrestre, os adversários seriam obrigados a recorrer ao jogo terrestre mais e mais. No começo, após as mudanças, esse realmente foi o foco das defesas, fortalecer a secundária em busca de uma chance de lutar contra os ataques aéreos, agora fortalecidos pelas regras. Mas com o tempo, e cada vez mais, se percebe que o caminho para o sucesso das defesas na NFL não é a secundária, ou a defesa aérea, e sim o pass rush, ou a capacidade da defesa de pressionar o Quarterback.

Claro que se você tiver uma grande secundária você vai ter uma vantagem. A secundária do Jets, com Darrelle Revis e Antonio Cromartie (vindo de ótima temporada depois de uma temporada inicial medíocre), com certeza inibiu passes contra o time de NY. Também ter safetys capazes de forçar interceptações como Ed Reed continuam colocando pressão no QB e fazendo eles pensarem duas vezes antes de passar a bola em profundidade (O que é um efeito lógico, se o índice de interceptações de um QB fica constante e ele começa a passar a bola mais vezes por jogo, o número de interceptações tende a aumentar - o que explica o aumento em interceptações recente). Grandes jogadores e secundárias bem montadas vão ter seu efeito, em qualquer época. Se você tiver a oportunidade de montar uma grande secundária, tem que montar.

O que acontece é que não é todo time que que é capaz de montar uma secundária com tanto impacto. Não estamos em uma era de boom em jogadores de secundária, temos vários bons jogadores mas não em número excessivo, que fosse suficiente para dar à maioria dos times da Liga uma unidade capaz de alterar jogos por conta própria. A grande maioria dos times tem que se contentar em ter uma secundária mediana, sem jogadores de nível All-Pro como Ravens, Jets e Steelers. Isso se dá também pelo fato de que a secundária teve uma redução no seu papel. Em 2002, uma dupla determinada dupla de Cornerbacks teria mais impacto no jogo do que em 2011, onde as regras são desenhadas para que eles justamente tenham menos impacto. Pra que um cornerback médio hoje impacte o jogo da mesma forma que um cornerback médio impactava o jogo em 2002, o cornerback médio de hoje precisa ser consideravelmente superior do que o cornerback médio de 2002. Como não estamos tendo um grande aumento no nível dos jogadores da secundária desde então, o número de jogadores capazes de impactar o jogo da secundária caiu em muito, e poucos times tem esse luxo.

No começo, a solução parecia uma enorme disputa entre os times para ver quem pagava mais a esses jogadores. No entanto, a solução que foi encontrada era muito mais barata e acessível: Se você não pode marcar os recebedores de forma a impedir que o QB tenha um alvo para o passe, você tem que impedir que o Quarterback passe, derrubando ele antes que ele lance - ou pelo menos causando pressão o suficiente para que ele não tenha tempo e calma de achar seus recebedores. Ou seja, os times decidiram que a melhor forma de combater o ataque aéreo não era na secundária,  sim com o pass rush, pressionando o QB antes do passe.

De certa forma, isso faz todo o sentido do mundo. Não importa se a sua secundária é boa ou não, ela recebeu muitas limitaçōes e pode fazer muito pouco pra evitar que o recebedor tenha uma posição favorável em campo, logo logo vão proibir os defensores sequer de tocar na bola. Com tantas restriçōes, é muito difícil manter um jogador do ataque sob controle por muito tempo, e se tiver tempo, cedo ou tarde alguém vai conseguir abrir espaço. O truque então é diminuir cada vez mais esse tempo. Os jogadores que pressionam o QB também receberam restriçōes ao longo do tempo, especialmente limitando o quanto do Quarterback eles podem visar, mas essas restriçōes são bem menores do que as restriçōes que os jogadores da secundária tem.

Isso chega, também, associado a uma certa abundância de jogadores da posição na NFL, o que facilita a vida dos times. Pelas limitaçōes que a regra oferece, pressionar o QB já é relativamente mais vantajoso do que jogar só com a cobertura e dar tempo ao QB adversário, e além disso atualmente o mercado tem muito mais jogadores de qualidade para jogarem na linha defensiva do que jogadores de secundária, o que torna montar um bom pass rush bem mais acessível do que montar uma boa secundária tanto em termos de quantidade quanto em termos financeiros. Pensem que só no último Draft tivemos Von Miller, Aldon Smith e JJ Watt, três pass rushers de altíssima qualidade que já estão jogando num nível entre os mais altos da posição.

Isso explica também a popularização crescente da defesa 3-4 nos últimos anos depois da defesa 4-3 ter dominado por tanto tempo a NFL (Pra saber mais sobre as defesas 3-4 e 4-3, recomendo esse post do nosso Especial NFL destinado às defesas). A defesa 3-4 é uma defesa que é muito mais agressiva, na sua forma padrão ela envia um homem a mais do que a 4-3 e permite variaçōes mais criativas para a blitz. Em outras palavras, é uma defesa que sacrifica um pouco da cobertura para colocar mais pressão no Quarterback. Ela naão era muito usada até as novas regras, quando elas começaram a se popularizar e estão em grande parte das defesas de sucesso da NFL (Steelers, 49ers, Ravens, Packers versão 2010, Jets, Washington Redskins e Houston Texans). Por ser uma defesa que coloca mais ênfase no pass rush, ela é a defesa ideal para enfrentar a situação atual do jogo aéreo, e embora qual defesa usar dependa muito dos jogadores que você tem, o fato dela ser uma defesa mais agressiva tem sido o principal motivo dela ter voltado a ganhar popularidade nos últimos anos.

Dois times de sucesso em 2011 nos mostraram como a secundária não precisa ser uma unidade forte, desde que sua defesa tenha outros fatores. No caso do Packers, a secundária era uma droga em termos de jardas, foi uma das piores da NFL e todo mundo conseguia produzir em quantidade. Mas ela compensava isso forçando turnovers e ganhando posses de bola extra para o time, então o Packers não se importava. Ter uma secundária sólida está cada vez mais difícil, então os times deixam de se preocupar com isso em alguma medida para usar sua defesa de outras formas. O que causou a queda do Packers foi a dificuldade da sua defesa de pressionar o Quarterback usando sua linha de frente, tirando o Clay Matthews. O outro exemplo é o campeão Giants, que tinha uma secundária fraca e desfalcada por lesōes mas cuja defesa era absolutamente dominante graças à sua capacidade de pressionar o Quarterback. Aaron Rodgers e Tom Brady, dois dos três melhores QBs saudáveis da NFL na atualidade, tiveram muitos problemas pra jogar contra essa defesa porque eles não tinham tempo para pensar ou para aguardar seus recebedores se desmarcassem, logo que eles recuavam para o passe eles precisava fugir de alguém ou apressar a jogada para evitar um sack.

O grande Bill Parcels já dizia: Quando você faz o QB deixar de olhar a secundária (onde estão seus recebedores) e passa a olhar a linha de scrimmage (de onde está vindo a pressão), você ganhou o jogo. E é pura verdade, quando um QB olha pra linha de scrimmage antes de soltar o passe ele está condenado, ele perde um tempo precioso, para de ter controle sobre as  movimentaçōes da defesa e do ataque e quando ele finalmente olha para a secundária precisa gastar mais tempo ainda para avaliar a situação, o que pode levar a um passe apressado e a um turnover. Sem falar que com sacks você queima jogadas do ataque e aumenta a distância das descidas.

O pass rush sempre foi parte importante de uma defesa, e jogadores como Derrick Thomas e Lawrence Taylor sempre foram diferenciais nos times que jogaram. Como eu sempre digo, grandes jogadores vão fazer diferença não importa em que era jogarem, e o pass rush sempre foi um componente importante das defesas, assim como a secundária, a defesa terrestre e tudo mais. Só que as novas regras estão dificultando ainda mais as coisas para a defesa, e a forma que tem se mostrado eficiente pra combater os fortes ataques aéreos até agora eé aumentar a pressão, tirar o QB da zona de conforto e não deixar o jogo aéreo estabelecer seu ritmo. Essa sempre foi uma opção pra defesas ao longo do tempo, ao lado de muita outras, que ficavam a crédito do pessoal envolvido, dos coordenadores e técnicos, etc. Mas com as novas regras - associado a uma certa abundância de pass rushers de qualidade - está tornando essa opção cada vez mais vantajosa se comparado com as outras. Cada vez mais os times estão menos preocupados com sua secundária e mais preocupados com a pressão que são capazes de colocar no QB adversário. Essa foi a forma encontrada pelos times de combater os ataques ajudados pelas regras. E essa é a tendência para as defesas da NFL daqui pra frente, especialmente com jogadores como Jason Pierre-Paul, Von Miller e Aldon Smith surgindo a cada ano. Cada vez mais, enquanto o ataque se direciona para o ar, as defesas se direcionam para o chão para combatê-los. Como não podem atacar o adversário no terreno onde elas levam vantagem, elas buscaram uma nova forma.

E até agora, está dando resultados: O Steelers de 2008, o Packers de 2010 e o Giants de 2011 eram times cujo principal foco defensivo era a pressão. O 49ers de 2011 ressurgiu atrás de uma defesa com uma boa secundária mas com uma linha de frente espetacular. O Ravens se manteve um Juggernault defensivo ao longo dos anos porque tem sido constantemente capaz de pressionar o QB e vencer a batalha das linhas. Times como Broncos, com defesas medianas, se mantiveram competitivos porque eram capazes de colocar pressão sem recorrer a blitz suicidas. Então por mais que as novas regras tenham direcionado o jogo pro ar, por mais que elas favoreçam os ataques e gerem estatísticas muito infladas para os QBs que nós insistamos em comparar sem lembrar de como o jogo tem mudado, é um erro pensar que com as novas regras só dos ataques vivem a NFL. As defesas também estão em constante adaptação pra poderem ter uma chance mesmo com as mudanças de regras. E os resultados estão bem na nossa frente.

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